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Advogados alertam que Câmaras não podem cassar prefeitos em MT

O fato de todos eles estarem no exercício de outros cargos eletivos diferentes do mandato de prefeito levantou dúvidas sobre a possibilidade das respectivas Câmara municipais iniciarem processos de impeachment contra os gestores.

Após prefeitos de Mato Grosso terem sido alvos de citações na delação do ex-governador Silval Barbosa (PMDB) e alguns deles até terem sido gravados na sala da chefia de gabinete no Palácio Paiaguás, recebendo maços de dinheiro, que segundo Silval, tratava-se de propina, surgiram manifestações de indignação popular e de vereadores, que pedem a cassação dos gestores.

Nos casos do prefeito de Cuiabá Emanuel Pinheiro (PMDB) e da prefeita de Juara Luciane Bezerra (PSB), ambos foram gravados recebendo dinheiro supostamente em troca da falta de fiscalização em obras, na época em que exerciam mandato de deputados estaduais. Já a prefeita de Chapada dos Guimarães Thelma de Oliveira (PSDB) teria cobrado propina de R$ 1 milhão em troca de uma emenda parlamentar de R$ 10 milhões no período em que foi deputada federal.

O fato de todos eles estarem no exercício de outros cargos eletivos diferentes do mandato de prefeito levantou dúvidas sobre a possibilidade das respectivas Câmara municipais iniciarem processos de impeachment contra os gestores.

Ao Gazeta Digital, o advogado especialista em Direito eleitoral, Rodrigo Cyrineu explica que isso seria ilegal e inconstitucional levando-se em conta os princípios da separação dos poderes e da fiscalização do Poder Executivo pelo Legislativo. “Há uma discussão bem severa com relação a isso porque, a princípio, os atos praticados antes do mandato que se está exercendo não seriam atos a conduzir à cassação por quebra de decoro porque a quebra de decoro que é submetida à atual composição da Câmara é decorrente do exercício para o qual ele foi eleito por último, que é o cargo de prefeito”, disse.

Segundo Cyrineu, a via possível para as cassações seria a via judiciária e não política, por meio das Câmaras. “Existem outras instituições, que é o Poder Judiciário, seja no âmbito da improbidade administrativa seja no âmbito da jurisdição criminal, que têm todas as condições de apurar isso, mas me parece que a princípio, a Câmara não teria autorização constitucional e legal para proceder um processo de cassação por fato cometido anteriormente ao mandato”, explica o jurista.

O advogado avalia que na impossibilidade dos vereadores cassarem mandatos de prefeito com base na delação de Silval Barbosa, o caso pode servir para fortalecer o seu papel fiscalizador. “Talvez isso seja um sinal para que haja uma fiscalização mais efetiva da gestão, mas dizer que há autorização pra investigar isso, sob a ótica do processo do direito administrativo, me parece que não é correto”.

O especialista explica que quem tem competência de processar os prefeitos e pedir suas cassações no âmbito da Justiça são o Ministério Público ou o estado de Mato Grosso, por ter sido este o ente federativo lesado, já que foi de lá que saiu o dinheiro do propinoduto já admitido pelo ex-governador tanto em juízo quanto em delação premiada. “A ação de improbidade administrativa pode ser impetrada pelo Ministério Público ou pelo ente federativo lesado. Nesse caso, em tese, é o estado de Mato Grosso”.

Cyrineu destaca ainda que o foro de competência para julgar prefeitos é o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT). Mas para isso, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), teria que desmembrar os inquéritos que autorizou. Além disso, a cassação depende não só do processo, mas da condenação, com trânsito em julgado. Ou seja, após esgotadas as possibilidades de recurso. “Pra ele perder o mandato, ele teria que ser condenado numa ação de improbidade ou numa ação penal com trânsito em julgado, que a consequência disso seria a suspensão dos direitos políticos dele. Ele também pode ser apeado por uma medida cautelar na esfera criminal ou por uma medida limiar numa ação de improbidade. Existe essa possibilidade”.

O advogado eleitoralista Hélio Ramos, explica que conforme a Lei orgânica do Município, a Câmara não tem competência legal de processar por quebra de decoro cometido antes do mandato porque a função dela é processar e julgar crimes de responsabilidade, ou seja, crimes cometidos no exercício da função de prefeito. 

No entanto, ele faz outra leitura com possibilidade de se julgar com base na Constituição Federal, que afirma que são princípios da administração pública a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, princípios que, em sua avaliação, foram descumpridos pelos gestores. “A lei orgânica do município de Cuiabá, nesse caso concreto, me parece em uma consulta rápida que ela é omissa. Mas se você faz uma interpretação sistemática, que a Câmara tem competência de processar prefeito, vereadores e os secretários por descumprimento de lei ou da Constituição e a Constituição prega a moralidade no exercício da função pública, então você tem uma condição de discussão de julgamento político-administrativo, ou seja, está nas mãos dos vereadores de Cuiabá fazer essa discussão”, disse em entrevista à Rádio Capital FM.

No caso da cassação pela via judiciária, Hélio Ramos explica que os prefeitos podem ter seus casos desmembrados para o Tribunal de Justiça, onde têm foro, ou ser julgados no STF por conexão de fatos com alguma autoridade com foro naquela instância. Mas ele destaca que tudo depende do entendimento do ministro relator do caso, Luiz Fux. “O ministro provavelmente deve deflagrar a investigação e, na primeira fase da investigação, o STF pode determinar algumas situações por conexão, manter esse réu que não tem foro no STF porque ele tem conexão com quem tem foro. Essa seria uma decisão. Mas a decisão mais comum tem sido a separação do processo. (...) Acho que a primeira fase da operação vai ser decretada pelo Supremo e aí, poderia o STF inclusive determinar na deflagração dessa operação, determinar o afastamento. Depende do pensamento do ministro”.

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