Maicon Semencio Esteves, de 27 anos, passou dias desaparecido após queda de avião em Mato Grosso
Um mês após sofrer a queda de avião em Peixoto de Azevedo, o piloto paranaense Maicon Semencio Esteves, de 27 anos, diz que o acidente e os dias que passou desaparecido em uma mata fechada mudou seus planos de vida.
Foram quatro dias perdido após o avião agrícola em que conduzia ter uma pane e cair. “A aviação para mim acabou”, disse o piloto, já em processo de recuperação, em entrevista ao MidiaNews.
Durante os dias em que esteve na mata, Maicon – que teve o corpo coberto por diversas queimaduras e ferimentos - não se alimentou e consumiu apenas água de um riacho que encontrou com o auxílio do GPS de seu celular.
Ele relatou que pensava em sua família - e principalmente, na filha, que deve nascer no 1º trimestre de 2019 - para tirar forças para lutar pela vida.
“Sempre tive receio. Eu sempre pensava na minha família, na minha esposa e principalmente na minha filha. Eu tinha medo, mas esse medo me motivava”, contou.
Maicon está internado no Hospital e Maternidade 13 de Maio, em Sorriso (a 420 km de Cuiabá), desde o dia 8 de novembro. Ele ficou internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) até o último dia 24 de novembro.
O piloto sofreu politraumatismo, queimaduras de 2º e 3º graus e infecções. Atualmente, faz apenas tratamento em câmara hiperbárica para reconstrução da pele queimada. Maicon teve mais de 25% do corpo queimado com a queda do avião.
Segundo a equipe médica do hospital, a previsão é de que ele deixe o hospital no dia 12 de dezembro.
A queda
No dia 3 de novembro, o piloto – que mora em Primeiro de Maio, cidade do interior do Paraná – foi até Tocantins para realizar um trabalho para uma fazenda de Alta Floresta. Em Confresa (a 1.160 km de Cuiabá), o piloto parou para abastecer e, ao decolar, percebeu que a aeronave apresentou alta temperatura no motor.
Ele parou em uma fazenda, averiguou o motor e, em conversa com o patrão por telefone, chegou a conclusão de que tratava-se apenas de algum erro de instrumento da aeronave.
“Liguei o motor, acionei o avião, fiz o voo em cima dessa fazenda para que, se caso apresentasse um problema novamente, eu pousaria ali, e dali não saía mais, chamaria um mecânico. Mas não apresentou nenhum problema e eu continuei o voo”, relembrou.
Ao sobrevoar uma região de mata em Peixoto de Azevedo, o problema de superaquecimento do motor começou a se apresentar novamente. O avião começou a perder força e, antes que Maicon pensasse em qualquer manobra, caiu.
“O problema começou a se apresentar novamente quando eu já estava em cima da mata. Eu achei que era um ventinho de proa – o vento de frente – que poderia estar segurando a aeronave, mas aí eu vi que o avião começou a perder altitude e que era uma pane”.
“Na hora do pouso, no meio do mato, eu quis pousar em barrigada para prejudicar o menos possível”, contou.
Durante a queda, o piloto disse que a asa esquerda do avião foi a primeira a bater em solo e entrou em chamas. Com a pancada, os ombros e cabeça do Maicon colidiram na janela, Nesse momento, os braços do piloto entraram em contato com as chamas e ele sofreu queimaduras graves.
“Já começou a pegar fogo no tanque da asa esquerda. Nesse tanque, provavelmente deveria ter 80 litros de álcool. O fogo sapecou os meus dois braços. Sorte minha que o fogo não entrava dentro da cabine. Foi quando consegui abrir a janela do lado direito e sair do avião”, relembrou
Quatro dias em mata fechada
O piloto disse que saiu desesperado da aeronave em chamas, gritando por socorro. No entanto, lembrou-se de que tinha deixado seu celular no local e que o GPS do aparelho poderia ajudá-lo a se salvar. Por isso, Maicon resolveu retornar ao avião, onde pegou seu celular, documentos e um carregador portátil.
“Meu celular tinha o GPS e eu iria usá-lo para ver o mapa da região. Consegui voltar no avião, peguei minha carteira, peguei o carregador portátil e o celular. E nesse mapa eu vi um rio, que dava até uma ponte”, contou.
Devido ao atrito entre os galhos das plantas e os braços já queimados, Maicon decidiu fazer todo percurso em busca de socorro pelo riacho.
“Por eu ter corrido desesperado no meio da mata, arrancou tudo o couro do meu braço. Então, pela água, eu conseguia andar sem machucar meu braço”, disse.
Foi um dia e meio andando em busca de socorro, mas o piloto decidiu voltar devido aos obstáculos - como galhos e partes fundas - encontrados no rio.
“Eu vi que nunca chegava à ponte e o rio, cada vez mais, tinha obstáculos, muito galho caído no meio da água, parecia que ele tava quase acabando. Daí eu desisti e quis voltar pro avião. Só que, quando eu quis voltar, me vi cada mais fraco, mais cansado. Mas tentei voltar. Até um momento em que estava muito cansado, deitei para descansar e de lá não levantei mais”, contou.
Foram quatro dias em mata fechada, com riscos de ataques de onças-pintadas, bichos peçonhentos e queixadas (porcos do mato). O piloto, porém, disse não ter visto nada.
“Eu fiquei um dia e meio andando e dois dias e meio deitado no mesmo lugar porque eu não tinha mais forças para levantar. Eu deitei em um lugar estratégico, onde eu deixava meu pé o tempo todo dentro d’água, e com pedacinho de [freixo] água do meu lado esquerdo, que era onde eu conseguia virar para poder beber água. Eu fiquei ali até o pessoal me achar”, afirmou.
Resgate
As buscas por Maicon foram coordenas pelo Corpo de Bombeiros de Mato Grosso com ajuda de mais de 50 voluntários – entre amigos e funcionários da Fazenda Bom Futuro, propriedade próxima de onde a aeronave caiu.
Maicon contou que, no momento em que foi encontrado, sofreu uma alucinação em que se despedia da família e de sua esposa.
“Eu já estava nas minhas últimas. Eu cheguei a ter um sonho de que eu estava me despedindo do meu pai, da minha mãe, da minha esposa. [No sonho] eu dizia à minha esposa que a minha filha ia nascer sem pai. Depois desse sonho, eu comecei a gritar mais por socorro. Nisso, eu vi uma pessoa e percebi que não era alucinação. Era uma voz de uma pessoa mesmo”, relembrou.
Maicon foi encontrado por voluntários, muito debilitado, no dia 7 de maio. Ele foi resgatado sem conseguir se mover, com queimaduras, picadas de insetos e inchado devido à insuficiência renal.
O piloto foi levado para fora da mata com uma maca improvisada até uma caminhonete e encaminhado para uma unidade de saúde do município.
Quatro milagres
Religioso, e já no fim do tratamento médico, Maicon Semencio acredita que tenha recebido quatro milagres nos dias de apuros.
“O primeiro milagre foi ter sobrevivido à queda do avião. O segundo milagre foi o tratorista, o único que me viu cair”, disse.
O tratorista ao qual o piloto se refere trabalha na Fazenda BomFuturo e foi quem assistiu o acidente. Poucos minutos antes da queda, o trator que ele dirigia estragou. Sem o barulho ensurdecedor, ele pode ouvir o barulho da avião e avistar o local exato da queda da aeronave agrícola.
“O terceiro milagre, e eu digo que foi o manto de Nossa Senhora que me cobriu, foi de eu não ter me deparado com animal nenhum. O quarto milagre foi o pessoal ter me resgatado”, enumerou.
“Se não fosse essa equipe de mais de 50 voluntários, um tio, um primo meu de Chapadão do Sul, meu irmão, dois amigos meus da cidade de Cláudia, mais funcionários da fazenda Bom Futuro, e vários funcionários do senhor Leonício... O seu Leonício, que deu bastante apoio a minha família. Eles que são meus anjos da guarda, que me resgataram”, disse.
Futuro
Após o acidente, Maicon diz ter desistido da aviação. Agora, trabalhará auxiliando o pai, Martinho Esteves, que tem um comércio na cidade de Primeiro de Maio.
"Eu vou trabalhar com meu pai, onde sempre trabalhei. A idade já está começando a chegar para ele, e ele está cansado de trabalhar. Antes, eu me dividia entre a aviação e o trabalho com ele. Em cima da hora, eu tinha que abandoná-lo por causa da aviação, e agora não tem mais isso. Agora vou estar 100% do lado dele", afirmou.
Comentários
Aviso: Todo e qualquer comentário publicado na Internet através do Olhar Notícias, não reflete a opinião deste Portal.