Segundo o relator do recurso, desembargador João Ferreira Filho, a causa de pedir da ação indenizatória não se resume somente ao abandono do autor na rodoviária de Campinas.
Não havendo qualquer violação ao dever de cooperação por parte do consumidor transportado, que simplesmente foi “esquecido” pelo motorista do ônibus no terminal rodoviário, há grave falha na prestação do serviço de transporte de pessoas, capaz de gerar, conforme o caso, dano moral indenizável. Com esse entendimento, a Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve decisão de Primeira Instância que condenara a Viação Nova Integração ao ressarcimento dos danos materiais causados ao passageiro (R$ 748,28), bem como ao pagamento de R$ 8,8 mil a título de indenização por danos morais em razão do “esquecimento” (Apelação nº 66452/2017).
Consta dos autos que o passageiro acabou sendo deixado para trás numa parada na rodoviária de Campinas, sem sua bagagem, o que fez com que ele perdesse a viagem de ônibus entre São Paulo-SP (cidade de origem) e Nova Canaã do Norte-MT (destino final).
No recurso, a empresa alegou que em Campinas havia apenas o embarque e não o desembarque de passageiros, e que seria impossível aos seus prepostos saber que um dos passageiros havia desembarcado de forma inadvertida e sem o conhecimento do motorista, não sendo razoável exigir uma recontagem de passageiros em locais onde não há previsão de desembarque. Alegou, ainda, inexistência de danos morais, dizendo que tal situação configuraria, no máximo, um dissabor simples, facilmente superável, plenamente transponível. Pediu, portanto, a reforma da sentença, para que o pedido fosse julgado improcedente. Alternativamente, pleiteou redução do valor indenizatório.
Segundo o relator do recurso, desembargador João Ferreira Filho, a causa de pedir da ação indenizatória não se resume somente ao abandono do autor na rodoviária de Campinas. “Consta da petição inicial que, após ter sido deixado à própria sorte, obviamente sem sua bagagem, o autor/apelado ‘procurou desesperadamente os funcionários da requerida no local da parada do ônibus em Campinas/SP, e informou o ocorrido, para que tomassem as providências necessárias, o que não foi feito’, e que, depois, comprou ‘passagem aérea até Cuiabá/MT, onde pretendia interceptar o ônibus (...) e seguir viagem, junto com sua bagagem que no ônibus ainda estava, até a cidade destino (Nova Canaã do Norte/MT)’, o que também não foi possível, já que, na Rodoviária de Cuiabá/MT, ‘foi informado por funcionários da ré/apelante que sua bagagem, mala e bolsa de mão haviam sido deixadas na cidade de Presidente Prudente/SP, e que não poderia mais seguir viagem no ônibus (...) porque sua passagem já havia sido cancelada’; foi informado, ainda, que se quisesse novamente embarcar (no mesmo ônibus) teria que (re) comprar nova passagem de Cuiabá até Nova Canaã do Norte”, medida com a qual, sem opção, aquiesceu”, informou o magistrado.
Conforme o relator, cabe à transportadora a obrigação de levar o passageiro do local de embarque ao de destino e zelar pela sua segurança durante o itinerário, atuando com cordialidade e presteza na prestação do serviço, observando, ainda, o direito do consumidor de ser transportado com pontualidade, segurança, higiene e conforto, do início ao término da viagem; de ser atendido com urbanidade pelos prepostos da transportadora e pelos agentes de fiscalização; e, ainda, de receber da transportadora informações acerca das características dos serviços, tais como horários, tempo de viagem, localidades atendidas, preço de passagem e outras relacionadas com os serviços.
“Tem-se, pois, que, para que seja imputado ao próprio passageiro a culpa pelo seu “abandono” no terminal rodoviário, eximindo a transportadora de qualquer responsabilidade pelo fato, é necessário que a ele, consumidor/transportado, seja possível atribuir violação ao dever de cooperação (...). No caso, porém, não houve menor violação ao dever de cooperação por parte de consumidor/transportado. As provas dos autos mostram que, por necessidades fisiológicas, o autor/apelado desceu do veículo e que, sem perceber sua ausência, o motorista, funcionário da transportadora/apelante, partiu sem o passageiro. Trata-se, evidentemente, de falha na prestação do serviço de transporte de passageiros”, pontuou.
Acompanharam voto do relator os desembargadores Sebastião Barbosa Farias (primeiro vogal) e Maria Helena Gargaglione Póvoas (segunda vogal convocada).
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